"Papai, esse livro é de adulto?", foi a pergunta que Aninha, nossa caçula de dois anos e meio, fez ao pai quando ele abriu O rei Bigodeira e a sua banheira (King Bidgood's in the bathtub. Ática, 2010, trad. Gisela Padovan), com texto de Audrey e ilustrações de Don, o casal Wood.
A pergunta se deveu às
ilustrações bastante realistas, não só em relação aos traços e cores, mas
também à composição. A folha de rosto traz a imagem panorâmica de um castelo
onde o leitor atento pode brincar de descobrir as personagens do livro: o rei,
em meio ao vapor da água quente; os cortesãos subindo a escada em direção à sua
sala de banho; e, figura importantíssima, o coitado do pajem.
As primeiras páginas do livro
mostram o pajem subindo as escadas com a água escaldante para o rei – que se
recusa a sair do banho. Cavaleiro, rainha, duque chamam o rei para guerrear,
almoçar, pescar, e o rei convida um a um a fazer tudo isso na banheira. Ao prazer
estético que provoca a exuberância das ilustrações soma-se a diversão de
encontrar nelas mil detalhes. Na cena do almoço, o banquete real servido sobre
as águas traz um bolo em forma de castelo, com miniaturas dos cortesãos e do
próprio rei em sua banheira. Docinhos em forma de ovelhas, com um pastorzinho
acompanhando, e bolos com pombas esculpidas fazem as delícias das crianças. Na
cena da pescaria, o desafio é encontrar os muitos animaizinhos escondidos entre
a vegetação, na água, no chapéu do duque: sapos, rãs, caramujos, minhocas,
patos, uma garça e um martim pescador.
Outro deleite a parte é observar
as expressões faciais dos cortesãos, do pajem e do próprio rei. O talento de
Don Wood para o desenho e a pintura de rostos é marca não apenas deste livro,
mas de outros como A casa sonolenta (The Napping House. Ática, 2009, trad.
Gisela Padovan). São muitos os detalhes a serem observados, que conferem à obra
um tom de crítica bem humorada. Todos os que tentam tirar o rei da banheira
acabam completamente encharcados, e o pobre pajem, que aparece em todas as
cenas como um símbolo da falta de noção do rei, está sempre carregando água
quente, ou a parafernália requisitada pelo rei para suas aventuras na banheira,
ou ainda está limpando o chão ensopado.
O texto é simples, repetitivo,
com um bordão a partir do qual se fazem as variações (o horário do dia e a
proposta ao rei). E o rei sempre chama o proponente com uma onomatopeia
referente à atividade que farão na banheira: bum para a guerra, hum para
o almoço, tchu para o baile de
máscaras...
Se, para as crianças, o livro é
garantia de uma deliciosa leitura cheia de interrupções ("olha o sapo!",
"olha a minhoca!"), para os adultos, numa segunda camada de leitura, O rei bigodeira apresenta uma crítica às
hierarquias sociais, à manutenção do luxo das autoridades à custa do abuso dos
serviçais – no caso, uma criança.
Talvez a obra mais conhecida do
casal Wood no Brasil seja O ratinho, o morango vermelho maduro, e o grande
urso esfomeado (The Little Mouse, The Red Ripe Strawberry, and The Big Hungry Bear.
Brinquebook, 2012, 2ª ed. Trad. Gilda de Aquino), que foi distribuído há alguns
anos pelo programa Coleção Itaú de Livros Infantis e está em praticamente todas
as escolas e em muitos lares. Embora não tão genial quanto O rei bigodeira, esse
livro traz uma inovadora interação ente o ratinho e o leitor – a partir de cuja
perspectiva o texto é narrado.
A Brinquebook publicou ainda Rápido como um gafanhoto (Quick as a Cricket,
trad. Gilda de Aquino), que infelizmente para nós vale a pena somente pelas
lindas ilustrações. A poesia do texto, cheio de rimas e aliterações (slow as a snail/ big as a whale),
perdeu-se completamente na tradução.
Finalmente, cabe lembrar do já
mencionado A casa sonolenta,
poema cumulativo que dá o tom de uma história que se passa numa casa onde todos
estavam dormindo. E para quem gosta de ilustrações instigantes, nesta obra a
graça fica por conta de tentar encontrar a pulga em cada cena.
Don e Audrey Wood têm outros livros publicados no Brasil que ainda não tive o prazer de ler: A bruxa Salomé (Heckedy Peg. 1994, trad. Gisela Padovan); Clara manhã de quinta à noite: uma história sem pé nem cabeça (Bright and Early Thursday Evening. 1996, trad. Luciano Vieira); A flauta da lua (Moonflute. 1993, trad. Dinah de Abreu Azevedo); e A palavra feia de Alberto (Elbert's bad word. 1994, trad. Gisela Padovan), todos pela Ática.
Don e Audrey Wood têm outros livros publicados no Brasil que ainda não tive o prazer de ler: A bruxa Salomé (Heckedy Peg. 1994, trad. Gisela Padovan); Clara manhã de quinta à noite: uma história sem pé nem cabeça (Bright and Early Thursday Evening. 1996, trad. Luciano Vieira); A flauta da lua (Moonflute. 1993, trad. Dinah de Abreu Azevedo); e A palavra feia de Alberto (Elbert's bad word. 1994, trad. Gisela Padovan), todos pela Ática.
Eis um pouco de Don e Audrey Wood
– com o perdão do clichê –, para todas as idades.
+++
Atualização:
Descrobri hoje, na quarta capa de A casa sonolenta, que a Ática publicou ainda outros dois livros de Audrey Wood: Meus porquinhos (Piggies.1999, trad. Gisela Padovan) e A história do pequeno pinguim (Little Penguin's Tale. 1996. Não descobri quem traduziu, mas provavelmente foi a mesma Gisela Padovan), este último ilustrado pela própria autora. Embora não tão brilhantes quanto as ilustrações do marido, as de Audrey trazem a mesma vitalidade e alegria, num conto que se insinua anti-moralista mas dá uma bela virada no final (aliás, nos finais). Para conferir, só mesmo recorrendo a sebos e bibliotecas, porque as obras - que fazem parte da Coleção Abracadabra - estão esgotadas no mercado.
+++
Atualização:
Descrobri hoje, na quarta capa de A casa sonolenta, que a Ática publicou ainda outros dois livros de Audrey Wood: Meus porquinhos (Piggies.1999, trad. Gisela Padovan) e A história do pequeno pinguim (Little Penguin's Tale. 1996. Não descobri quem traduziu, mas provavelmente foi a mesma Gisela Padovan), este último ilustrado pela própria autora. Embora não tão brilhantes quanto as ilustrações do marido, as de Audrey trazem a mesma vitalidade e alegria, num conto que se insinua anti-moralista mas dá uma bela virada no final (aliás, nos finais). Para conferir, só mesmo recorrendo a sebos e bibliotecas, porque as obras - que fazem parte da Coleção Abracadabra - estão esgotadas no mercado.
Lia, eu estou amando este novo blog, de verdade! Como faz falta ter uma conhecedora de livros pra nos indicar livros de qualidade pros pequenos :)
ResponderExcluirObrigada por compartilhar as leituras das suas filhotinhas, que por sinal acompanhei de pertinho desde que Emília estava na barriga (assim como a nossa Maria está <3)!
Morro de saudade dos seus posts familiares e queria MUITO ver como as meninas estão hoje (Margarida só vi neném e Ana só por relato de parto), posta fotooo! hehe
Que Deus abençoe a sua família!